terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Mosca

E nasce uma mosca.
Asas recém formadas batem apreensivas e desesperadas na debalde tentativa de um vôo menos turbulento, mais calmo. Um par de enormes olhos azuis multifacetados analisam o ambiente e o labelo tateia pela primeira vez o solo à procura de um local fértil para depositar futuros ovos. Meia dúzia de patas ainda inaptas para uma escalada posicionam o inseto horizontal e paralelo ao chão.
Uma espátula corta o ar e...
Morre uma mosca.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Morte e Sangue na Noite de Halloween

O TELEFONE tocou pela terceira vez na noite de Halloween, mas Samanta hesitou em atendê-lo, afinal, da última que o fez, recebeu um bom trote sobre um zumbi querendo “Arrancar suas tripas pelas orelhas”. Sendo assim, resolveu deixar o aparelho tocar incansavelmente até parar.

A menina de cabelos negros e lisos sentou-se entediada no sofá, apanhando uma das revistas de moda que, junto a uma imensa pilha de folhetos velhos, uma mesa de madeira empoeirada sobre um tapete bordô já mofado e um sofá marrom descascado, ajudava a acentuar o ar fantasmagórico que o lugar transmitia. Mas nada desses detalhes pitorescos pareciam incomodar Samanta, que folheava desatenta as páginas emboloradas.

O sino da igreja ao lado badalou doze vezes assustando a solitária menina na casa ao lado. Ela então jogou o que lia para o lado, prendeu seus longos cabelos em uma fita esbranquiçada e subiu as escadas de mogno, onde refletia a luz lunar que dava lugar às sombras dos arbustos lá fora. Ao chegar ao quarto, o telefone tocara novamente, mas, já acostumada com o tilintar do aparelho, ela não deu atenção e jogou-se sobre a cama, dormindo algumas horas.

Samanta então acordou e viu que ainda era de noite. Como não ouviu barulho de carro algum entrando na garagem de sua casa, percebeu que seus pais ainda não chegaram de viagem, e resolveu, para se distrair, ir à cozinha tomar um copo de água. Foi quando o principal motivo pela qual estou aqui lhes contando essa história aconteceu.

O telefone parara de tocar já fazia algumas horas, mas infelizmente a menina estava dormindo quando o “Triim” soou pela última vez. Então, o sujeito vestido de preto que ligava da cabine telefônica do outro lado da rua tomou por convencido que a menina da qual tentava conversar saíra amedrontado da casa, o que daria tempo suficiente para roubar os móveis e aparelhos da residência. Caso contrário, se ela ainda estivesse lá, não haveria problemas em degolá-la à luz do luar, em plena noite de Halloween.

Formaco saiu da cabine telefônica e decidiu começar seu plano de furtar a casa dos Ouriques, que após irritantes dias sem deixar a morada, resolveram viajar para o Miami, e tiveram a capacidade de deixar, em época de Halloween, a filha sozinha, mas não seria problema. Se tivesse que arrombar, arrombaria. Se tivesse que matar, mataria. Medo não era o maior problema àquela hora.

O homem retirou um canivete no bolso e girou com facilidade a faca metálica que usou para invadir a casa: estava dentro do aposento, na sala de jantar, para ser mais preciso.

Samanta, da cozinha, ouviu alguns barulhos vindos da porta da sala de jantar, mas imaginou que algumas crianças bateriam à porta na esperança de ganhar montanhas e montanhas de doces, mas esse ano quem receberia uma surpresa, seria ela.

Formaco caminhou até a sala de visitas, que ficava ao lado da cozinha. Sempre analisando o ambiente, observando tudo aquilo que levaria ou não, mas um barulho de louça tocando a pia o assustou. É claro que aquela ladainha de “não terei medo de matar se for preciso” soava mais real, quando ele imaginava não haver ninguém na casa, mas as coisas mudariam um pouco se a menina estivesse lá. Segurando firme o canivete na mão direita, ele observou a sombra de Samanta aproximar-se da porta, até que ela apagou a luz e saiu em direção à sala de visita.

Formaco viu que a garota passou por ele sem notar sua presença, mas apesar de sentir medo das conseqüências, esfaquearia e mataria a qualquer custo. O medo que brotava em cada gota de suor transformou-se em euforia. Uma lâmina corta o ar, um grito falho de dor, e uma menina jaze morta no chão. O sangue se espalha aos poucos pelo carpete bege, mas Formaco não mataria apenas com uma facada. Mesmo que já morta, o homem decidiu degolá-la e deixar o pulmão para fora do corpo que, agora virado para cima, deixaria os Ouriques petrificados de medo, susto e terror.

Aos poucos o sangue foi coagulando, mas a obra já estava completa. “Fora perfeito” pensou ele. Ninguém viu, ninguém ouviu e ninguém descobrirá que fora o antigo namorado de Samanta quem degolara e mutilara o corpo inteiro da filhinha do papai.

- Paralelo -

Em Miami, uma mulher bronzeada se enrolava na cama com o marido nu. Ambos gemiam e gritavam em um quarto de hotel, quando o telefone tocou:
- Sim – disse Cezar querendo passar uma voz de irritado por interromper um momento prazeroso com sua esposa.
- Desculpe-me, senhor, ligar uma hora dessas, mas um homem, dizendo ser seu vizinho, está na outra linha. Ele parece querer dar uma notícia ao senhor.
Cezar tampa o microfone do telefone e comenta com a mulher que o vizinho chato quer incomodar. A senhora Marta bufa irritada, e diz que nada é mais importante que o que faziam, mas o marido resolve descobrir o que é de tão extrema importância.
- Pode colocá-lo na linha – disse o Senhor Ouriques – acho que nem deveríamos ter dado o nosso telefone do hotel para o vizinho.
- Vamos logo com isso – miou Marta – ou então desisto de fazer aquilo.
- Só um minuto – respondeu ele sorrindo.
A voz no telefone falava apressada, Cezar virava o olho enquanto o vizinho falava, mas ao perceber do que se tratava, congelou. Sua voz emudeceu, o telefone escorregou da sua mão e sua esposa ficou curiosa. Ambos nem imaginavam o quanto erraram em deixar a filha sozinha em uma noite de Halloween.